domingo, 14 de fevereiro de 2016

Trump, eleições no Irã e o fim das sanções

12/2/2016, Franklin Lamb (de Teerã)Counterpunch


Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu


Os restantes cinco candidatos Republicanos, dos doze iniciais, esfalfam-se tentando angariar as simpaticas dos eleitores Republicanos da Carolina do Sul, os quais, como a maioria de seus concidadãos, estão furiosos com os políticos "pague-e-use" de Washington. Na véspera da primária de 27 de fevereiro naquele estado, os eleitores iranianos terão ido às urnas para votar nas eleições do país deles, igualmente cruciais.

Os iranianos votarão em eleições gêmeas, para o Parlamento do Irã e para eleger outro corpo governante, ainda mais poderoso que o Parlamente e autônomo, conhecido como "Assembléia dos Especialistas" [ing. Assembly of Experts]. E, sim, o fator Donald está ativado nessas duas eleições iranianas. Antes de Trump ter-se envolvido, as eleições iranianas já se havia mostrado divisivas e difíceis. Muitos candidatos relativamente moderados foram rejeitados pelas autoridades linha-dura durante o período de seleção de candidatos. Vários daqueles candidatos vetados apoiam o presidente Hassan Rouhani, arquiteto chave do acordo nuclear para o Irã, que eles aprovam.

Por seu lado, Rouhani continua a viajar pelo mundo para iniciar o processo de retorno do Irã ao comércio internacional global. Essas viagens de Rouhani tem sido vistas por muitos, no Irã, como parte das atividades eleitorais do governo, para fazer aumentar o apoio ao presidente, dado que as eleições são também, em parte, umreferendum da atuação de Rouhani e do acordo nuclear.

Candidatos e políticos linha dura em geral uniram-se à campanha eleitoral em torno da questão nuclear. Trump chanou de "estúpidos" todos os apoiadores dos acordos que constituem o Plano Amplo Conjunto de Ação, PACA [nome oficial do chamado 'acordo nuclear', ing. Joint Comprehensive Plan of Action (JCPOA)], do programa nuclear iraniano. As recentes entrevistas de campanha de Trump – uma mistura de nativismo, conservadorismo e populismo de direita, estão sendo monitoradas de perto em Teerã, e nos EUA nenhum dos atuais candidatos sequer se aproxima da virulência dele. Donald insiste que o governo Obama fez gorar completamente a negociação com o Irã, uma vez que, sendo o principal negociador, teria de ter negociado um acordo com o Irã e garantido resultado com muito mais vantagens para os EUA.

Trump garante que, fosse ele o presidente, teria poupado os EUA da obrigação de pagar ao Irã o que ele (erradamente) diz que seriam $150 bilhões. Diz que teria conseguido isso, sem dificuldade, dizendo o seguinte aos iranianos: 

"Seguinte, caras. Nós, os EUA devemos $19 trilhões. Somos país sem dinheiro. Não podemos pagar os $150 bilhões de dólares." Para os iranianos, Trump teria de ter acrescentado: "Mas nós queremos pagar. O dinheiro é do Irã!" E Trump diz que, nesse caso, responderia "Não podemos pagar. Não temos dinheiro! Não temos esse dinheiro!" Trump garante ao público que o ouve falar, que não arredaria pé, que absolutamente recusaria pagar os $150 bilhões. Nesse ponto, a reunião seria interrompida. Mas, na versão Trump do mundo, dois dias depois os iranianos telefonariam e diriam a ele: "Temos de chegar a um acordo. Vamos acertar isso." E o Irã, então, aceitaria que ninguém pode exigir que os EUA paguem os $150 bilhões.

O que deixou muitos iranianos com a pulga atrás da orelha e coçando a cabeça, e os levou a peguntar a visitantes: "Quem é esse sujeito? foi, em parte, a evidência de que Trump parece não saber nem que os fundos iranianos congelados nunca foram parte do orçamento dos EUA; e ninguém, antes de Trump, sequer sugerira que aqueles fundos não pertencessem ao Irã. Nos termos do Acordo PACA, os EUA são obrigados apenas a devolver o dinheiro do Irã que foi confiscado e é mantido em contas congeladas à espera do fim das sanções contra o Irã.

Em entrevista semana passada à CNN, Trump, sem conhecer os fatos do acordo, com certeza não sabia que o dinheiro jamais deixou de pertencer ao Irã. Pois nada disso o impediu de 'detonar' o acordo nuclear e 'prometer' rasgá-lo em tiras tão logo se torne presidente dos EUA. Parece não saber do que fala, e dá a impressão de 'informar-se' exclusivamente pelos releases distribuídos pelo AIPAC, que repetem sem mudar uma vírgula as 'declarações' histéricas do primeiro-ministro de Israel Netanyahu, para quem, se o Irã puser a mão em mais de $250 bilhões, usará todo o dinheiro para financiar mais terrorismo.

É claro que nem Trump nem qualquer presidente dos EUA rasgará os Acordos PACA e, se alguém tentar, aliados gloabis dos EUA e provavelmente também a opinião pública nos EUA se oporão firmemente. Nem os iranianos deixariam passar.

Os iranianos, diferentes do candidato Trump, são realistas sobre o que o alívio das sanções realmente significará para o Irã, reconhecendo que $20 bilhões do dinheiro deles a ser devolvido está comprometido com projetos com a China, onde fundos liberados não podem ser gastos; e que há dezenas de bilhões de dólares presos em empréstimos sem juros a setores de energia e de bancos do Irã. 

O Irã tem a 4ª maior reserva comprovada de petróleo cru do mundo e espera aumentar rapidamente a produção, o que pode levar a dezenas de bilhões de renovado comércio de petróleo, apesar do mercado em baixa. Mas nada disso acontecerá no curto prazo.

Na campanha eleitoral em curso no Irã, muitos iranianos manifestam crescente insatisfação com os termos do acordo, e Rouhani tem perdido alguns apoios por não dar sinais de poder cumprir as promessas de benefícios que adviriam depois de o acordo nuclear ser assinado. As eleições desse mês no Irã terão, muito provavelente, de ser analisadas por esse prisma.

Pesquisas recentes de opinião pública no Irã mostram que há queda de aproximadamente 10% no apoio da população ao acordo. Pesquisa feita pelo Centro de Estudos Internacionais e de Segurança da University of Maryland mês passado mosta que o apoio dos iranianos ao acordo de julho passado ainda está perto de 72%. Em agosto, a percentagem era de 75%. Na resposta a um quesito sobre se o acordo nuclear foi vitória ou derrota para o Irã, em agosto passado 36,6% dos iranianos disseram que foi vitória; mas na pesquisa mais recente a percentagem caiu para 27,4%. A tendência atual da opinião pública iraniana mudou, com percentagem crescente (43% há seis meses; hoje, 54%) de pessoas que entedem que o acordo foi benéfico para os dois lados, para o Irã e para a comunidade internacional que assinou o acordo.

Os apoiadores chamados "moderados" do presidente Rouhani podem ter grande impacto nas eleições desse mês, e fazer mudanças no Irã. O público iraniano é sofisticado e entende muitas nuanças de o que e como os Acordos PACA significarão para o próprio país e sua população. Pesquisas recentes mostram que há queda de aproximadamente 10% no apoio da população em geral ao acordo.

As ideias de Trump, de que o governo Obama teria cedido e se comprometido a entregar ao Irã grande quantidade de dinheiro a ser usado para favorecer o extremismo islamista não resiste nem à análise mais superficial. O governo Obama e seus parceiros no acordo nuclear destacam que o Irã receberá ao longo dos próximos anos, não $150 bilhões, mas algo mais próximo de $56 bilhões, $32 bilhões dos quais já foram recebidos, restando $20 bilhões para modernizar a indústria iraniana do petróleo, para reparos muito necessário na infraestrutura do país, mais uma demanda da população, além de medidas para controlar a inflação.

O Banco Mundial também estima que cerca de $100 bilhões de fundos iranianos foram congelados em outros países, metade dos quais Teerã conseguirá liberar como resultado do fim das sanções. Está em curso no Irã uma disputa em torno do destino do dinheiro, entre os desejos da população e os projetos dos linha-duras, que querem o dinheiro para atender a várias demandas dos militares, inclusive do Corpo dos Guardas Iranianos Revolucionários [ing. Iranian Revolutionary Guard Corps (IRGC)] e seus aliados da linha-dura. Esse mês, os iranianos estarão indiretamente votando essa questão chave. 

Estudantes que entrevistei parecem avaliar com realismo, que a vida será pouco afetada, no curto prazo, por efeito dos acordos chamados "nucleares"; mas são muito claramente favorávies à 'normalização' das relações entre o Irã e a comunidade global, ao mesmo tempo em que reconhecem que o Irã e o Ocidente têm opiniões conflitantes em questões como 'direitos humanos à moda EUA', governos religiosos, vários aspectos do Islã, sobre terrorismo e sobre Israel, dentre outras; e que essas diferenças não desaparecerão em futuro próximo. (...) 

Há mudanças a caminho para o Irã e para os EUA, e eleições em andamento provavelmente apontarão para que lado se encaminhará cada um desses países, e o impacto que terão na região do Oriente Médio-Ásia Ocidental.*****

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